Berlim é a capital da Alemanha reunificada (até 1990 Bona fazia esse papel) e resultou do maior projeto de reconstrução do pós-guerra. Tem talvez das histórias mais conturbadas do século XX e convive, à conta de erros que lhe são alheios, com as cicatrizes dessa história. Andando pelas suas ruas podemos encontrar as marcas de um passado recente que quase destruiu uma das mais importantes e grandiosas cidades alemãs.
A partir de 1940, Berlim sofreu inúmeros bombardeamentos, especialmente no último ano da guerra, tendo a maioria dos edifícios ficado em ruínas. Alguns dos edifícios míticos mais afetados foram o Reichstag, a Porta de Brandenburgo e a Igreja protestante de Kaiser Wilhelm. Os dois primeiros foram integralmente reconstruídos a igreja mantém-se até hoje parcialmente destruída, tendo sido construída uma nova igreja à volta dos destroços.
Um dos primeiros locais que visitamos mal chegamos à cidade é o Memorial do Holocausto, homenagem aos seis milhões de judeus vítimas do regime nazi. O Memorial está localizado entre a Postsdamer Platz e a Porta de Brandemburgo e consiste de uma área de 19.000 metros quadrados coberta com 2.711 blocos de cimento que simbolizam as vítimas assassinadas nos campos de concentração.
Em contrassenso a este momento ali bem perto podemos visitar o local, e pouco mais, onde estava localizado o Bunker que albergou o Hitler no final da guerra e onde este acabou por se suicidar. O Bunker localizava-se a cinco metros de profundidade, estava protegido por mais quatro metros de concreto armado, tinha trinta salas espalhadas por dois pisos, tinha saídas na construção principal e uma saída de emergência e estava equipado com sistema de ventilação contra gases venenosos, geradores a gasóleo e portas de aço. Foi demolido no pós-guerra.
Mesmo no final da guerra, os soldados russos tomaram Berlim mas não sem uma ultima e feroz resistência dos soldados alemães que ainda se mantinham na cidade. Desta batalha que durou poucas semanas morreram mais de 80 mil soldados. Em homenagem aos soldados russos que libertaram a cidade e que ali ficaram foi edificado um Memorial localizado na Rua 17 de Junho, perto da Porta de Brandenburgo. O Memorial é local de repouso de cerca de cinco mil soldados russos que ali foram enterrados depois da guerra.
Continuando a nossa visita ao passado, entramos agora no centro do Terror Nazi. Entre 1933 e 1945 a principal policia secreta Nazi, o Comando das SS e a Central de Segurança do Reich tinham a sua sede no local onde podemos agora encontrar um dos principais museus ao ar livre de Berlim, a Topografia do Terror. Os edifícios foram destruídos e no seu local encontramos agora diversas exposições onde ficamos a conhecer o regime nazi por dentro - as suas medidas totalitárias, as forças de opressão e supressão de liberdades, a propaganda, o estimular de um regime racista e xenófobo e o premiar da "raça" ariana e das famílias tradicionalistas. É um espaço curioso de visitar onde ficamos com uma ideia do percurso que levou à II Guerra Mundial e a todas atrocidades cometidas pelo regime nazi e em particular pelos seus mais altos representantes e instituições.
Após a Segunda Guerra Mundial, a cidade foi dividida. O lado oriental passou a ser a capital, enquanto que o lado ocidental da cidade se tornou um enclave da Alemanha Ocidental, cuja capital era Bona. Cercada pelo muro de Berlim, entre os anos de 1961-1989, Berlim viu-se mais uma vez envolvida numa "guerra" que não tinha pedido, mal tratada e rasgada pela ganância dos "vencedores". Berlim estava assim no centro da Guerra Fria onde se manteve até que em 1989, as mudanças políticas que ocorrem na Europa Oriental levaram à queda do muro de Berlim e à abertura das fronteiras e em 1990, a Alemanha reunifica-se e Berlim volta a ser a capital.
Destes anos atribulados restam memórias espalhadas por toda a cidade como o Check Point Charlie, a mais famosa fronteira de Berlim cujo nome deriva do alfabeto fonético da NATO em que cada letra do Alfabeto corresponde um som (Alpha a letra A, Bravo a letra B e Charlie a letra C). O Checkpoint Charlie se tornou um símbolo da Guerra Fria, representando a separação leste e oeste.
Marcas do Muro de Berlim, a maior e mais polémica de todas as fronteiras, podem ser encontradas por toda a cidade, como uma cicatriz que queremos manter para recordar um momento importante das nossas vidas. Agora não passa de um fait diver, de uma atração para turistas mas durante décadas separou famílias, amigos e vizinhos, foi a causa de mortes de diversos berlinenses e foi um fator de separação de uma cidade e de um país. Com 155 metros de comprimento e 3,60 de altura, o muro dividiu a cidade de 1961 a 1989. Durante a sua existência mais de cinco mil pessoas conseguiram fugir, mais de três foram apanhadas e 152 morreram.
O melhor exemplo desta separação é a Bernauer Straße onde hoje podemos encontrar o Memorial ao Muro. Esta rua é um dos símbolos da divisão tendo sido literalmente rasgada pelo muro com casas cortadas ao meio ou literalmente encostada à sua parede, famílias, amigos, casais etc foram separados de forma violenta, tendo tentado por diversos meios escapar para o outro lado (escadas, saltar de janelas, construção de túneis, etc.). Na visita ao memorial ficamos a conhecer estas e outras histórias, assim como podemos visitar o monumento que relembra e homenageia a cidade dividida e as vítimas do regime comunista.
Aqui também ficamos a conhecer, e esta é uma das estórias que mais me marcou, a Capela da Reconciliação que, após a construção do muro ficou localizada numa zona de ninguém, inacessível aos seus paroquianos. Durante mais de 20 anos (1961 - 1985) a igreja foi o símbolo de uma cidade dividida, até que em 1985 foi dinamitada com o objetivo de fazer esquecer esta divisão. No local podemos conhecer a nova capela construída no mesmo local e algumas memórias guardadas da antiga capela como os sinos e uma antiga cruz que conseguiram escapar à destruição.
Karl-Marx-Allee era a mais famosa avenida da Alemanha comunista. Localizada entre a Strausberger Platz e a Frankfurter Tor a avenida é ladeada por edifícios de estilo soviético dos anos 50'. É uma avenida verdadeiramente impressionante e que mostra de forma clara como foi a presença das forças russas nesta cidade.
É um dos maiores fragmentos Muro de Berlim ainda existentes, localizada na Mühlenstraße, nas margens do Rio Spree. Preservada da demolição devido às 105 pinturas de artistas de todo o mundo, iniciadas em 1990 aqui representadas. É uma das maiores galerias ao ar livre do mundo, com mais de 1 km de extensão.
Apesar de viver com as marcas de um passado recente Berlim não é de todo uma capital presa a este passado. Berlim é uma cidade voltada para o futuro, moderna, cosmopolita, vibrante e com ambições de ser a melhor. É orgulhosa e por isso nos deslumbra todos os dias com a sua eficiência e grandeza, marcando presença na vida dos berlinenses e de todos que por lá passamos e que não lhe ficamos indiferentes ... Na verdade é difícil sair de Berlim sem deixar por lá uma parte de nos que queremos muito voltar para reencontrar.
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